Políticas públicas de saúde

Políticas públicas de saúde

quarta-feira, 11 de maio de 2011

 O fim da vida: aspectos éticos e bioéticos

A doença é uma experiência de fragilidade que provoca, na situação terminal, a consciência aguda da mortalidade, uma ideia da finitude da existência. No momento da terminalidade, ficamos perante a experiência-limite da existência. Isso faz com que essa experiência tenha um misto de angústia, mistério e profunda intimidade consigo mesmo. Müller; Matta e Zogbi, (2004) esclarecem melhor essa situação.

Saiba Mais

Leia o artigo O paciente terminal: vale a pena investir no tratamento?. Você encontrará pontos controversos relacionados ao cuidado no fim da vida.

E agora? Como ficam suas convicções quanto à decisão médica?

Devemos ter em mente que a morte no século XXI, embora o grande desenvolvimento da medicina tenha permitido um prolongamento da vida e a cura de várias doenças, ainda é vista como tabu. Entretanto, muitas pessoas são levadas a pensar, equivocadamente, que podem enganar a morte ou até burlar o processo de morrer. Essa situação é evidenciada na busca da cura de uma doença e na ânsia de salvar uma vida quando a morte já está presente – o óbito ocorre apesar dos esforços da equipe de saúde. Esse é o fim da vida, mas será mesmo?

Dando sequência ao nosso estudo, já sabemos que um dos maiores temores do ser humano, na atualidade, é o de ter sua vida à custa de muito sofrimento solitário numa unidade de terapia intensiva ou quarto de hospital, sustentado por meio de tubos e máquinas.

Nessas situações, temos de lembrar que os profissionais de enfermagem têm obrigação profissional e humanitária de prestar assistência, minimizando o sofrimento do paciente, seja ele físico ou mental, ajudando-o a morrer tranquilamente e apoiar os familiares durante a evolução do processo de morrer e após o evento morte. Você já viveu essa situação e tem falado sobre ela?

Muitas vezes, até para os profissionais da enfermagem, a morte provoca frustrações, sensação de derrota e impotência ou até medo da própria morte. Quando isso ocorre com um profissional de enfermagem que está cuidando de um paciente terminal, até mesmo de forma inconsciente, pode ser levado a fazer visitas mais rápidas evitando o enfrentamento do processo de morrer.

E, nesse contexto de angústia e medo frente à morte, surge a questão: É possível escolher a forma de morrer? Essa questão está intimamente ligada aos casos nos quais as pessoas querem decidir acerca do momento em que a morte deve ocorrer como eutanásia, distanásia, suicídio assistido, entre outros.

Ultimamente, temos observado o desenvolvimento de movimentos que buscam a dignidade no processo de morrer, diferente do apressamento da morte, caracterizado pela eutanásia, e do prolongamento do processo de morrer com intenso sofrimento, que é a distanásia.Kovács (2003) trata desse assunto em uma abordagem bioética e você deve saber um pouco mais fazendo essa leitura posteriormente.

Referindo-nos sempre ao doente terminal, a distanásia é, etimologicamente, o contrário da eutanásia. Consiste em atrasar o máximo possível o momento da morte usando todos os meios, ainda que não haja esperança alguma de cura, o que significa infligir ao moribundo sofrimento adicional, pois não conseguirão afastar a inevitável morte, mas apenas atrasá-la umas horas ou uns dias em condições deploráveis para o enfermo. Repense sobre isso e discuta com sua equipe para ter maior firmeza em suas decisões.

Perante a iminência de uma morte inevitável, médicos e doentes devem saber que é lícito conformarem-se com os meios normais que a medicina pode oferecer e que a recusa dos meios excepcionais ou desproporcionados não é como o suicídio ou a omissão irresponsável da ajuda devida a outrem. Essa recusa, muitas vezes, pode significar apenas a aceitação da condição humana, que se caracteriza, também, pela inevitabilidade da morte.

Outro conceito importante é a ortotanásia, que se fundamenta no princípio de deixar o doente morrer de forma natural por abstenção ou omissão de cuidados. São casos em que nenhuma atitude é tomada para reverter o quadro do paciente frente a sua morte certa em razão do seu estado de saúde.

Será que as pessoas devem ser forçadas a permanecer vivas pelo avanço da medicina atual?

Será que é dever do profissional de saúde concordar em estender indefinidamente a vida, mesmo que esteja irreversivelmente relacionada a aparelhos?

No tratamento, pode ser incluído o desejo do paciente ou da família de continuar vivendo ligado a aparelhos?

Essas questões existem no cotidiano hospitalar e, para respondê-las, temos que conhecer a lei e a ética que exigem: “tudo seja feito” para manter uma pessoa viva. A insistência em adiar a morte com todos os meios disponíveis, contra o desejo do paciente, não é prática frequente nos serviços de saúde e chega a ser contrária à lei, pois o paciente tem o direito de recusar a receber tratamento. Faça uma reflexão sobre isso e busque outras leituras.

Temos de lembrar que a morte é algo natural, intrínseco ao viver. E há um determinado momento em que as tentativas de curar podem deixar de demonstrar compaixão ou de fazer sentido. Nesse caso, o esforço dos profissionais de enfermagem deve ser no sentido de tornar o tempo de vida que resta ao paciente o melhor possível, com apoio humano e espiritual, tanto ao cliente quanto aos familiares, sendo que a intervenção médica limitar-se-ia a aliviar a dor e outros sintomas que o incomodem.

Se a morte é inevitável, a pessoa não tem o direito de cometer suicídio para não sofrer? Difícil pensar nisso, não? Mas...

É importante que percebamos que não há diferença entre o suicídio de uma pessoa que possui uma doença terminal e uma pessoa que não é considerada doente terminal. Em ambos os casos, haverá uma morte provocada. Sabe-se que situações como depressão, conflitos familiares, sentimentos de abandono, desespero, dentre outros, são os responsáveis, na maior parte das vezes, pelos suicídios, independentemente do estado de saúde da pessoa.

Pensando dessa maneira, o ato de provocar intencionalmente, por compaixão, a morte de um doente incurável e terminal, pondo fim aos seus sofrimentos é conhecido como eutanásia. Quando, porém, uma pessoa ajuda outra a se matar, o termo utilizado é o suicídio assistido. Atualmente, o termo eutanásia é usado tanto para designar a eutanásia propriamente dita como também o suicídio assistido.

A discussão acerca do direito que uma pessoa teria quanto a acabar ou não com sua vida já é bem antiga e abrange o mundo todo. Existem países em que a tentativa de suicídio é criminalizada. Já no Brasil, é punido o induzimento, a instigação e o auxílio ao suicídio com pena de 2 a 6 anos se ocorrer a morte da pessoa ou de 1 a 3 anos se a pessoa sobreviver, mas tiver ficado com graves lesões. Se a vítima for menor ou tenha a capacidade de resistência diminuída, por exemplo, um paciente com doença terminal, a pena é aumentada, conforme as disposições do artigo 122 do Código Penal Brasileiro.

Sabemos que ao cogitar sobre a legalização da eutanásia, não estamos discutindo dar direitos à pessoa que morre, mas consiste em alterar a lei e a prática para que médicos, familiares e outras pessoas, direta e intencionalmente, possam acabar com a vida de um enfermo em fase terminal ou sem expectativa de cura. O grande temor que gira em torno do tema é a preocupação com os abusos, a exploração e a erosão dos cuidados aos mais vulneráveis.

Em outras palavras, a eutanásia não diz respeito ao direito a morrer pacificamente, mas, sim, ao direito de outra pessoa poder matar.

Os defensores da eutanásia argumentam que sua legalização serviria para que os pacientes morressem pacificamente, acompanhados por suas famílias e médicos, mas o que foi verificado nos lugares onde foram aprovadas leis que a autorizam é que a legalização apenas legitimiza a morte dos pacientes.

Então, caros alunos, para finalizar e entendermos melhor os tantos conceitos abordados, verifiquemos o seguinte esquema:

Distanásia

Atrasar o máximo possível o momento da morte usando todos os meios, mesmo que não haja esperança de cura e que isso signifique infligir sofrimento adicional ao enfermo.

Ortotanásia

Deixar morrer o doente de sua morte natural por abstenção ou omissão de cuidados.

Eutanásia

Provocar intencionalmente, por compaixão, a morte de um doente incurável e terminal, pondo fim aos seus sofrimentos.

Suicídio Assistido

Ajudar uma pessoa a se matar.

Com a apropriação desses conhecimentos e conceitos, temos que a área da saúde não é uma ciência exata e, como tal, os limites entre a vida e a morte, não estão bem delineados. No entanto, a enfermagem deve sempre trabalhar em prol da pessoa, fazendo valer sua autonomia e seu direito à dignidade. De nada adianta o conhecimento sem a intervenção prática, mesmo porque, o profissional da enfermagem tem um compromisso social e, para tanto, deve se empenhar ao máximo quando há uma chance de cura, lançando mão de todos os meios disponíveis para aplicar uma terapia útil. Em Vieira, 2007, você encontra uma análise “imperdível” sobre esses tópicos desafiantes.

Sendo assim, não podemos esquecer que é a enfermagem que operacionaliza as políticas de saúde. Somos nós que damos sentido, corpo e qualidade à saúde pública. Então, devemos ter consciência do nosso papel na garantia dos direitos dos clientes, independentemente da situação que se apresentem.

É imprescindível que compreendamos o acesso universal à saúde e o respeito às singularidades de cada indivíduo, sem qualquer tipo de discriminação, de acordo com os direitos e garantias constitucionais. Por isso, recomendamos que você complemente esta UE lendo Mariutti; Almeida e Panobianco (2007).


Referências

KOVÁCS, M. J. Bioética nas questões da vida e da morte. São Paulo: Psicologia USP, 2003, 14(2), 115-167.

MARIUTTI, M.G; ALMEIDA, A.M; PANOBIANCO, M.S. O cuidado de enfermagem na visão de mulheres em situação de abortamento. Rev. Latino-am. Enfermagem 2007, janeiro-fevereiro; 15(1).

MULLER, M. C.; MATTA, A. Z.; ZOGBI, H. J. (2004). O princípio da autonomia em seleção de sexo: aspectos psicológicos. Em Clotet, J. &Goldim, J. R. (Orgs.). Seleção de sexo e bioética (pp. 57-68). Porto Alegre: EDIPUCRS.

VIEIRA, T.R. BIOÉTICA E ENFERMAGEM: uma análise interdisciplinar, In, MALAGUTI, W. (Org.). Bioética e enfermagem

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