Políticas públicas de saúde

Políticas públicas de saúde

sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Informe ENSP - Participação: instrumento dos determinantes sociais da saúde

Informe ENSP - Participação: instrumento dos determinantes sociais da saúde:

'via Blog this'ENSP, publicada em 21/10/2011

Filipe Leonel e Marina Bittencourt

A influência da crise financeira nos determinantes sociais da saúde (DSS) foi o tema da principal conferência do eixo 2 - Promovendo a participação: liderança comunitária para ação sobre os determinantes sociais da saúde - no segundo dia (20/10) da Conferência Mundial sobre Determinantes Sociais da Saúde (CMDSS), ministrada pelo economista Bernardo Kliksberg, da Universidade de Buenos Aires. Com o tema Institucionalizando a participação na definição de políticas, a mesa também contou com a presença do secretário de Gestão Participativa e Estratégica do Ministério da Saúde, Luis Odorico Monteiro, que apresentou a experiência brasileira em participação - institucionalizada a partir das conquistas da própria população do país.



A atividade foi coordenada pela pesquisadora do Centro de Saúde Pública e Equidade da Índia, Thelma Narayan, e também contou com a presença de Nonkosi Khumalo, coordenadora da Treatment Action Campaign da África do Sul, e Asa Cristina Laurell, da Universidade Autônoma Metropolitana do México. A coordenadora abriu a mesa afirmando que o motivo de todos estarem reunidos no congresso é a promoção da saúde para todos, instaurada a partir do compromisso assumido há trinta anos na Conferência de Alma Ata. "Em Alma-Ata, cerca de 130 países assumiram o compromisso de buscar a equidade e um acesso universal à saúde. Estamos em um país em que a participação vem desde a década de 1980; queremos aprender com suas práticas e criar espaços de participação."

Durante a principal conferência, Bernardo Kliksberg disse que o mundo vive em sua maior crise econômica desde a depressão de 1930. Essa crise, segundo ele, tem forte incidência nos DSS. "A taxa de suicídio na Grécia teve um aumento de 40% nos últimos cinco meses, e a maioria das pessoas mortas está na faixa dos 35 a 60 anos, e a grande parte são comerciantes ou profissionais extremamente arruinados pela receita econômica da Grécia. Isso mostra que as próprias saídas do governo para a crise impactaram a saúde daquele país."

Trabalho afeta diretamente os determinantes sociais da saúde

O economista revelou que os DSS englobam controle sanitário, níveis de educação, acesso a alimentos e trabalho, por exemplo. Para comprovar a interferência da economia, citou um alerta da OIT. "Há um alarme da Organização Internacional do Trabalho sobre a situação de desemprego dos jovens no mundo. Estima-se que o número de jovens desempregados no mundo é duas ou três vezes maior que a taxa de desemprego dos próprios países. Se não existir trabalho, os DSS serão extremamente afetados. E isso não esta relacionado ao Ministério da Saúde dos países, trata-se de uma consequência de más administrações e uma política ruim."

O palestrante ainda fez questão de ressaltar que a participação popular é um importante instrumento de enfrentamento das desigualdades e o setor saúde pode ser decisivo nessa questão. "Setenta por cento dos problemas de saúde estão relacionados aos determinantes sociais da saúde. A participação em saúde melhora o resultado dos programas, fortalece o capital social e empodera a população", finalizou.

Após a conferência de abertura, a coordenadora da mesa direcionou perguntas aos demais convidados. Ao ser questionado sobre os imperativos legais para a participação no processo de desenvolvimento do país, Luis Odorico ressaltou que a participação no Brasil se trata de uma política de Estado. Ele recordou o movimento da Reforma Sanitária, que buscou modificar a organização da sociedade e trouxe consigo uma nova concepção de saúde, entendendo-a não apenas como a ausência de doenças, mas com a prerrogativa de ser um direito de todos e dever do Estado.

"Gestão participativa é uma conquista da sociedade"

Odorico finalizou enaltecendo os princípios da universalidade e participação do Sistema Único de Saúde e convocou a população para a 14ª CNS. "Gestão participativa faz parte do nosso governo, é uma conquista da sociedade. Estamos na preparação para a 14ª CNS, o evento sobre saúde mais importante no Brasil, e contamos com a presença da nossa população."

Em seguida, ao ser questionada sobre o impacto da participação no processo político da África do Sul, Nonkosi Khumalo disse que o regime democrático de seu país é relativamente novo e o conceito de participação trabalhado com a população é o de justiça social. "Se não institucionalizarmos a participação, teremos os ricos mais ricos e os pobres mais pobres. Assim como no Brasil, precisamos de um Conselho Nacional de Saúde que sirva aos interesses da população, e não dos representantes dos Ministérios. Asa Cristina Laurell falou sobre o sucesso da participação no Brasil. "No auge da luta contra a ditadura, a população teve a habilidade de incorporar a participação como política de um novo governo e institucionalizá-la. Isso explica o sucesso da participação no Brasil."

Sessão Integrando Novos Enfoques para a Participação

Na tarde do segundo dia do evento, dando continuação ao eixo Promovendo a Participação, foi realizada a sessão Integrando Novos Enfoques para a Participação, coordenada por Luiz Loures, diretor executivo do Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/Aids (Unaids), e que contou com a participação de Nila Heredia, presidente da Associação Latino-Americana de Medicina Social (Alames) e ministra da Saúde do Estado Plurinacional da Bolívia; Roberto Tomas Morales Ojeda, ministro da Saúde de Cuba; Bridget Lloyd, coordenadora global do Movimento para a Saúde dos Povos; e Rene Lowenson, coordenadora da Equinet (Rede Regional de Equidade em Saúde do Sul da África).

Nila Heredia, ministra da Saúde do Estado Plurinacional da Bolívia, apresentou um programa implementado em seu país, o Desnutrição Zero, que tem a meta de acabar com a desnutrição infantil e já conseguiu alcançar resultados muito positivos. Em 2003, 27,64% dos menores de 2 anos de idade sofriam de desnutrição. Com o programa, em 2010, essa porcentagem caiu para 15,89%. O programa seguirá com seus esforços até atingir a meta de não haver nenhuma criança desnutrida na Bolívia. A ministra explicou que o Desnutrição Zero está alcançando resultados porque é um programa realizado através de uma intersetorialidade entre as autoridades nacionais, departamentais (equivalente às estaduais), municipais e locais, inclundo também o governo as instituições, organizações e a população. Heredia apontou que "o tema da desnutrição é ligado ao tema da soberania e segurança alimentar", acrescentando a necessidade de que todos os setores assumam a desnutrição como tarefa central, e seja considerada não apenas uma tarefa do governo.

Roberto Tomas Morales Ojeda, ministro da Saúde de Cuba, expôs um exemplo de ação conjunta para atingir metas. A grande campanha de alfabetização foi realizada nos anos 1960 em Cuba, onde a ajuda de toda a população foi fundamental para vencer a batalha: o analfabetismo foi completamente erradicado, e essa conquista é mantida até hoje com a totalidade de sua população alfabetizada. Na área específica da saúde, o ministro Ojeda comentou que o médico da família é a base do sistema de atenção básica, e Cuba atenta especialmente na formação de recursos humanos, que agem não apenas para sua própria população, mas também contribuem com outros países.

A coordenadora do Movimento para a Saúde dos Povos (criado em 2000), Bridget Lloyd, afirmou que "para juntar as vozes você precisa de recursos; é um processo, não é simples" e acrescentou que as políticas têm de ser acessíveis à população na base. Bridget contou sobre um documento que sua organização realizou, o Global Health Watch, que tem como objetivos promover os direitos humanos como base para a saúde da população, fortalecer os vínculos entre as sociedades civis do mundo inteiro, dentre outros. O documento pode ser baixado gratuitamente na internet. Já Rene Lowenson, coordenadora da Equinet (rede formada no sul da África juntando diversos setores, baseada no compartilhamento de valores), apontou que a África tem recente experiência de luta pela libertação dos povos, há muito acontecendo na sociedade civil e na luta por direitos no continente. Rene também comentou sobre a necessidade de, além da participação social, abordar o poder e controle social. "Não podemos subestimar o poder dos povos na África."

Fotos: Peter Illicev

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